A resistência da arte circense e sua história em meio aos arranha-céus da cidade
Por, Luma Silva
Centro de Memória do Circo
O escritor e dramaturgo brasileiro, Caio Fernando Abreu, fala: ''Odeio Circo. Aliás, odeio tudo que me encanta e vai embora.'' A magia do circo sempre encantou as pessoas das mais diversas classes e épocas, levou brilho e risadas pelas cidades, em seus tempos nômades, viajou ao redor do mundo e, principalmente, ao redor do imaginário de cada pessoa, seja nos filmes ou nas obras literárias. Atualmente, ela persiste em sua magnificência, mas passa a carregar um molde a mais de resistência, luta para agraciar as pessoas presas na nada pacata selva de concreto paulistana.
O Centro de Memória do Circo (CMC)
é um aconchego não só para o artista circense, mas para todo público que
acompanha essa história. Nele é possível conhecer um pouco da trajetória da arte no mundo e principalmente no Brasil. A localização é
estratégica, ela está entre uma travessa da Av. São João em frente ao Largo do
Paissandu, na Galeria Olido, onde,
antigamente, era considerado o pátio do circo.
No começo do século XX, o local recebeu
as principais lonas e palhaços que seriam consagrados, como por exemplo,
o Palhaço Piolin e a
Trupe dos Irmãos Carlo. A escolha da região também foi influenciada pelas
segundas-feiras, pois nesse dia os artistas, ao redor do Largo Paissandu,
realizavam reuniões e proporcionavam encontros, além de fecharem novos
contratos para seus negócios, esse dia ficou registrado como ‘’Café dos Artistas’’.
A Instituição, que ocupa o lugar hoje, mantém essa tradição de no mesmo dia
realizar em seu espaço o E.A.P – Encontro de Artistas da Palhaçaria, dentro do
memorial, como forma de resistência da arte, mas também da tradição e dos
artistas.
O CMC foi inaugurado em 2009 e possui
um acervo rico, desde materiais audiovisuais até instrumentos
importantes à história do circo. O ambiente é dividido em duas partes, no
térreo existe a Sala Maranhão, rica em detalhes e conhecimentos, ela conta ainda
com uma maquete interativa e um mural com todas as linguagens artísticas
praticadas dentro dessa cultura popular que arranca sorrisos dos espectadores
há anos.
A outra parte está presente no primeiro
andar, e é possível encontrar maquetes do Circo Garcia, um dos grupos mais
importantes para história do circo. Encontramos, também, exposições com a
trajetória de diversos artistas em seu cotidiano de chegada nas cidades,
acompanhada pela sua companhia artística, como também, a caracterização dos
personagens, mostrando ao visitante os encantados das montagens detalhadas.
A exposição conta com uma linha do
tempo da Idade Média até 2009, ano em que o memorial foi criado. As histórias
de famílias influentes no ramo ficam nesse andar, junto de alguns objetos
pessoais dos artistas em expostos em outras seções do local.
Além das exposições o memorial realiza
saraus feitos no último sábado do mês. Outra iniciativa da fundação é o
projeto Sou de Circo, a qual acompanha um programa de
formação e experimentação profissional de jovens circenses em museologia e
história do circo, ela compõe mais um empreendimento de preservação do acervo
do Centro de Memória do Circo.
Maquete exposta na sala Maranhão. (Foto: Luma Silva) |
Parede com o detalhamento das artes circense. (Foto: Luma Silva) |
Objetos que pertenciam ao Palhaço Piolin. (Foto: Luma Silva) |
Maquete exposta em homenagem ao Palhaço Piolin. (Foto: Luma Silva) |
Linha do tempo da trajetória da arte circense. (Foto: Luma Silva) |
Espaço destinado ao EAP- encontro de artistas da palhaçaria. (Foto: Luma Silva) |
Visão do espaço para o Largo do Paissandu. (Foto: Luma Silva) |
Um jovem artista
Mas nem só de
memória vive o circo. Jovens artistas mantém viva a arte circense - e a
reinventam. É o caso de Alex Bingó, 31 anos, natural de Franca – interior
de São Paulo
O jovem de 17 anos trabalhava com
ciências de computação, mas não se via feliz e, então, resolveu fazer aulas de
teatro e circo, a partir daí sua vida mudou e ele se encontrou. ‘’A arte
liberta; abriu minha mente, diversas portas e me deu inúmeras oportunidades,
além de ter desenvolvido meu senso crítico’’, contou Alex.
Após o início das aulas, Bingó se mudou
para capital em busca de mais oportunidades e aqui se desenvolveu. Ele está em
duas companhias: a Resto D’ontê e a La Folia criada
por ele e sua namorada, Beatriz Marin, 20, bailarina e portagem (duo
acrobático); além de fazer eventos e outras especializações em seu tempo livre.
Apesar do CMC pertencer ao patrimônio
histórico, Alex, como profissional da área mantém-se sem o apoio do governo, o
que é um grande obstáculo. A arte circense, em geral, não possui uma
valorização, investimento e visibilidade dificultando o trabalho dos artistas,
os quais desde a queda do circo resistem por amor pela arte.
Alex transita em quase todas as
linguagens artísticas da arte circense, muitas registradas nos acervos do
Centro de Memória do Circo. Do tecido acrobático ao trapézio, passando pela
perna de pau e os malabares, na pirofágia, na acrobacia de solo, roda cyr até a
portagem (duo acrobático), compondo um vasto repertório de atuação, o qual
agrega valor ao seu trabalho e nas suas formas de resistir contra o cinza
engravatado da cidade. Essa luta persistente pela arte circense acaba
iluminando as pessoas que gerem o Centro de Memória do Circo e o próprio Alex.
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